Este conteúdo foi produzido pelo colunista Augusto Rocha, professor associado da Universidade Federal do Amazonas (UFAM) e diretor adjunto da Federação das Indústrias do Estado do Amazonas
A escritora e jornalista Eliane Brum publicou “Banzeiro òkòtó: Uma viagem à Amazônia Centro do Mundo” (Companhia das Letras) e faz esta proposição muito apropriada ao cotidiano do aquecimento global, seca na Amazônia, enchentes, furacões e tornados, mundo afora. A forma como percebemos a Amazônia, como periferia, como um lugar de extração de riqueza ou como o centro de um modelo de vida equilibrado representa o que somos. Um olhar de explorador ou de convívio. De harmonia ou de indignação. De superioridade ou de inferioridade. De tutela ou de irmandade.
As oportunidades da Amazônia são muitas. A navegação moderna a vapor para Manaus (1853), com o Barão de Mauá, começou conectando Belém a Manaus e Manaus a Nauta, no Peru. Nesta época, a borracha já entrava na pauta de exportações do Amazonas. Esta navegação era restrita a navios brasileiros e peruanos, pelo acordo entre os dois países. Mas a exportações do Amazonas eram realizadas pelo estado do Pará, pela configuração tributária daquela época. Neste caso já havia na prática uma transferência de impostos, do “Amazonas” para aumentar a arrecadação do “Pará”, que não eram unidades federativas separadas (por isso as aspas). Hoje, o Amazonas segue a contribuir mais do que receber nos impostos federais. A história se repete?
Atualmente, as navegações internacionais adentram a Amazônia, com um acesso facilmente realizável, diferente do que se fazia antes de 1874, quando foi estabelecida uma linha regular entre Manaus e Liverpool, com exportações da cadeia da borracha, antes da existência do Porto de Santos. Ou seja, naquele momento, a operação portuária de Manaus era mais importante do que em São Paulo. Ademais, já existia, ainda no período pré-colonial e 100 anos antes do Porto Santos, produção de algodão e tecidos em Manaus, conforme analisado pela Professora Etelvina Garcia, em vídeo no YouTube gravado neste mês.
Já tivemos esta importância na região – onde perdemos esta dominância? Havia processo industrial e um prenúncio da biodiversidade? A história se repete? Começamos a ver novamente as oportunidades Amazônicas. A questão que perdura de Francisco de Orellana até hoje é que há riqueza. Contudo, o que temos é um enorme potencial de riquezas. Podemos destruir e transferir a riqueza para outros lugares, mas também podemos nos juntar a natureza e entender que a maior riqueza não está nos palácios, no ouro ou na floresta transformada em mobiliário. Tudo depende do modo de vida e do que cada um acredita.
Como disse Ha-joon Chang, “não há livre mercado”, nem “comércio justo”. O que temos são estruturas de poder, controle e regulagem que modelam os mercados e as relações. O centro pode ser Londres, mas poderia ser São Paulo, ou a minha vila. O que queremos da Amazônia é ainda algo incerto, mas podemos tê-la como almoxarifado ou como um Shangrilá. Tudo dependerá de como nos sentimos frente ao mundo, com medo ou confiança. Ainda não nos harmonizamos como país, pois ainda queremos competir e guerrear entre Estados. Temos uma longa caminhada antes de parar de destruir.