Este conteúdo foi produzido pelo colunista Augusto Rocha, professor associado da Universidade Federal do Amazonas (UFAM) e diretor adjunto da Federação das Indústrias do Estado do Amazonas
A falta da experiência social e do convívio entre os detentores do poder econômico no Brasil com todos os povos e pessoas que integram à Amazônia tem provocado uma corrente de destruições de potenciais de riqueza que afeta negativamente todo o país. A necessidade de transcender esta condição é fundamental não só para o atingimento de grandes metas globais, como aquelas associadas ao aquecimento global, mas também ao que, supostamente, almejamos que é o progresso para o Brasil.
Acontece que a prática de negação das pessoas da Amazônia permeia todo o imaginário e discursos. Tipicamente quem fala, reflete, opina, contra-argumenta e define o futuro da região não coloca seus pés no solo amazônico. As visitas são rápidas, pelo Google ou por outro mecanismo colonizador, que usa um imaginário muito distante da realidade local. Afinal, a Amazônia não é uma, mas muitas, sendo constantemente negadas em seus saberes, dimensões, peculiaridades, oportunidades e necessidades. Como se fosse uma área desabitada de humanos.
A grande oportunidade da região existirá a partir do momento em que as pessoas da região começarem a ser consideradas em todas as suas capacidades. A oportunidade acontecerá quando os projetos que deram certo começarem a ser expandidos e quando aqueles que sabidamente não dão certo começarem a ser reduzidos. A eliminação de garimpos ilegais, que usam subempregos e abusam da destruição ambiental e a maximização de atividades industriais não destrutivas, como o Polo Industrial de Manaus, são duas dimensões que precisam ser consideradas.
Entretanto, o que temos visto no país é uma discussão atávica, onde exalta-se uma volta a um passado que deveria ter sido esquecido. Ainda se discute se o petróleo é o futuro, enquanto claramente o futuro está na tecnologia e em energias limpas. Precisamos com urgência alocar recursos da ciência nacional para ampliar o entendimento da complexa estrutura biotecnológica da Amazônia. Este esforço é grande demais para ser minimizado. Deveríamos atrair cientistas e empresas do mundo, liderados por uma estrutura local daqueles que são da região. Fora disso, continuaremos a subordinar um modo império-colônia que deveria também ter sido superado.
Havia mais de 20 anos que o Centro de Biotecnologia da Amazônia (CBA) aguardava uma mínima regulação. Finalmente, em 03/05/2023, foi concedida a sua autonomia como Centro de Bionegócios da Amazônia. A instituição será gerida por uma organização social que envolve entes como a Universidade do Estado do Amazonas e o Instituto de Pesquisas Tecnológicas (IPT), de São Paulo. Esta mistura nacional será excelente, se conduzida pelo respeito ao objetivo de concepção do CBA e a adoção de lideranças locais, temperadas pela experiência do IPT.
Há órgãos federais na região faz muitos anos, como o Instituto Nacional de Pesquisas da Amazônia (INPA), a Universidade Federal do Amazonas (UFAM), Museu Paraense Emílio Goeldi e tantos outros. É necessário que o novo CBA compreenda o que tem travado a transformação dos saberes regionais em inovações tecnológicas globais e até onde estes conhecimentos já têm sido utilizados em produtos do mundo. Entender a transferência da tecnologia local para produtos e as barreiras enfrentadas será algo fundamental, para que paremos de ter a biopirataria velada ou escancarada.
Encontrar as saídas que levem a um aproveitamento sábio dos recursos da Amazônia é uma necessidade que será combatida de todas as formas. Será necessário atenção para a real e frágil oportunidade que há na Amazônia. Se repetidos os padrões e estruturas de poder do passado, seguiremos como colônia e desperdiçaremos a maior das oportunidades que se apresentam para o Brasil, desde a sua formação. O CBA talvez não tenha se dado conta, mas este é o papel que a sociedade brasileira espera dele. Fora disso, teremos dado mais um passo errado.