Ações humanas ameaçam a sobrevivência da Amazônia e o clima global, alertam cientistas

Acompanhe o que a ciência tem revelado sobre a Amazônia com a colunista Dra. Janaína Guidolini, idealizadora da Accessible Science.

Este conteúdo foi produzido pela colunista Janaína Guidolini, idealizadora da Accessible Science.

Cientistas compararam as mudanças que estão acontecendo na Amazônia com outras regiões da América do Sul e do mundo. Eles usaram informações de um relatório feito por cientistas de vários países, incluindo pessoas de comunidades locais e povos indígenas, que fala sobre a biodiversidade, a cultura e a história da Amazônia.

O relatório mostra que as mudanças feitas por ações humanas estão acontecendo muito rápido e podem acabar com muitas espécies de plantas e animais e seus habitats. Se a Amazônia continuar sendo desmatada, isso vai ter um impacto irreversível no clima de todo o planeta.

Os resultados dessa pesquisa foram publicados na revista científica Science em 27 de janeiro de 2023, no artigo intitulado “Human impacts outpace natural processes in the Amazon”.

A Amazônia é um bioma riquíssimo em biodiversidade, abrigando mais de 10% de todas as espécies de plantas e animais vertebrados conhecidas no mundo, embora contemple apenas uma pequena parte da superfície da Terra.

A Amazônia também se destaca por regular os ciclos globais de carbono e água, o que significa que ajuda a manter o equilíbrio climático do planeta. Infelizmente, devido às mudanças climáticas, os eventos climáticos extremos, como secas e enchentes, estão se tornando mais frequentes na região.

Grande parte da água na Amazônia vem das chuvas produzidas pela própria floresta. Essa água ajuda a manter a floresta viva, protegendo-a contra variações relacionadas às chuvas e ao fogo. Entretanto, a floresta é muito sensível à degradação e à remoção de partes dela.

Quando partes da floresta são destruídas, pode levar a uma mudança irreversível da paisagem, com consequências graves para a região. Isso porque a região se tornará cada vez mais seca, com poucas árvores e mais parecida com uma savana (tipo de cerrado, mas pobre em biodiversidade). Esse tipo de mudança pode ser muito difícil de reverter.

A destruição da floresta amazônica tem acontecido por vários motivos:
– Desmatamento,
– Queimadas,
– Erosão do solo.
– Mudanças no uso da terra e da água
– Extração de minerais.

As mudanças climáticas globais também têm impacto na região, com alterações na quantidade de chuvas e aumento do nível do mar. Além disso, a caça e pesca excessiva, a introdução de espécies exóticas e a poluição são outras ameaças para a biodiversidade da região. Os autores se concentraram no desmatamento e nos ciclos de carbono devido a seus papéis críticos nos sistemas da Amazônia e da Terra.

O maior problema atual é a conversão de terras de florestas e pastagens degradadas em produção de soja e gado, principalmente para exportação. Entre 1995 e 2017, 17% da floresta amazônica foi degradada por exploração madeireira, fogo, ou expansão de estradas. Em 2019, cerca de 14% da floresta havia sido desmatada, principalmente nos estados brasileiros do Pará, Mato Grosso, Rondônia e Amazonas.

As exportações de soja do Brasil para a China aumentaram em 2000%, principalmente para alimentar o consumo de carne na China, enquanto a América do Sul é a maior fonte de biomassa para a União Europeia. Essa intensa atividade agrícola é uma das principais causas do desmatamento não só na Amazônia, mas em todo o mundo. A situação é preocupante, pois a biodiversidade da região é muito rica e importante para o equilíbrio ecológico global.

Para proteger as florestas e evitar a conversão de terras para outros fins, deve-se impedir o financiamento internacional de projetos que impulsionam a conversão dessas terras. Há também um programa de construção de estradas e barragens chamado Iniciativa para a Integração da Infraestrutura Regional da América do Sul, que pode ter impactos ambientais significativos.

Projetos para dragar e canalizar rios no Equador e no Peru podem prejudicar a biodiversidade e a subsistência de comunidades locais. Da mesma forma, projetos de desvio de água podem impactar afluentes importantes, como os rios Tapajós e Xingu, transformando-os em reservatórios artificiais e prejudicando o ecossistema. É importante garantir que as políticas de proteção florestal sejam eficazes e tenham um impacto positivo na preservação da natureza e da biodiversidade.

Algumas ações foram tomadas para combater o desmatamento na Amazônia, como um plano lançado em 2004 que melhorou o monitoramento do desmatamento e promoveu a posse da terra para comunidades locais. Outras medidas, como a Moratória da Soja e a Lista Negra de municípios com altas taxas de desmatamento, ajudaram a reduzir o acesso de empresas da agropecuária ao crédito financeiro e aos mercados internacionais.

Os autores coletaram informações sobre 55 diferentes processos que afetam os ecossistemas terrestres e aquáticos na América do Sul e em todo o mundo, incluindo processos naturais e causados pelo homem. Eles descobriram que as mudanças feitas pelo homem na Amazônia estão acontecendo muito mais rápido do que as mudanças naturais, como o clima e a geologia.

Essas mudanças feitas pelo homem estão afetando milhões de quilômetros quadrados em apenas algumas décadas, enquanto mudanças naturais levam milhões de anos. Infelizmente, isso significa que estamos transformando os ambientes amazônicos mais rapidamente do que as espécies, as interações ecológicas e os ecossistemas são capazes de se adaptar.

Além disso, a Amazônia é um dos maiores reservatórios de carbono do mundo. Isso significa que a floresta ajuda a absorver dióxido de carbono (CO₂) da atmosfera, o que é importante para combater a mudança climática. No entanto, com as rápidas mudanças que estão acontecendo, a floresta pode se tornar uma fonte líquida de carbono, ou seja, ao invés de ajudar a absorver CO₂, pode começar a emitir mais CO₂ na atmosfera.

Os autores falam sobre a importância de usar os recursos naturais da Amazônia de forma sustentável para desenvolver as economias locais e integrá-las à economia internacional. Mais de 40 milhões de pessoas vivem na Amazônia, sendo que mais de 65% delas moram em cidades e sofrem os efeitos das mudanças climáticas. As comunidades indígenas e tradicionais têm um papel importante na proteção dos ecossistemas, da biodiversidade e da cultura da Amazônia.

Uma economia baseada na biodiversidade e nos serviços que os ecossistemas prestam pode trazer benefícios em diversas áreas, como saúde, educação, saneamento e emprego. É importante melhorar a qualidade de vida da população local, tanto em áreas urbanas quanto rurais, por meio do desenvolvimento sustentável.

O objetivo é garantir o sequestro de carbono, a recuperação da biodiversidade e o sustento humano. Para isso, é fundamental integrar os conhecimentos científicos e comerciais modernos com as práticas tradicionais das comunidades locais e indígenas.

Sustentabilidade duradoura significa que os sistemas naturais, econômicos e sociais devem coexistir por muito tempo. Para que isso aconteça, os projetos de desenvolvimento da Amazônia precisam atender às necessidades imediatas e de longo prazo da população local. Entre essas necessidades estão serviços de comunicação e transporte de alta qualidade para melhorar a comercialização de produtos, bem como investimentos em educação, ciência e tecnologia.

É importante evitar a construção de novos projetos de infraestrutura em grande escala (como hidrelétricas e rodovias muito longas) que causem danos ao meio ambiente e à população local. A mineração também deve ser evitada em áreas onde possa ameaçar a vida e a biodiversidade da região.

Para uma gestão responsável dos recursos naturais da Amazônia, é necessário priorizar ações que preservem as espécies, a diversidade de habitat e o equilíbrio do ecossistema. Além disso, é importante promover intercâmbios culturais e educacionais e melhorar a governança descentralizada.

Desde 2000, as políticas nacionais têm sido importantes para controlar as taxas de desmatamento na Amazônia. Porém, os mecanismos de mercado que avaliam apenas o preço das commodities não consideram o valor real dos recursos naturais da região. Por isso, é importante que esforços de conservação da paisagem considerem os valores sociais e ambientais para garantir a sustentabilidade da região.

Existem políticas públicas disponíveis para corrigir os problemas no mercado e preservar as florestas e rios. Essas políticas são baseadas em estratégias bem-sucedidas usadas em outras partes do mundo, onde as florestas e rios foram preservados por várias décadas, mesmo com um forte desenvolvimento econômico.

Essas políticas conseguem precificar adequadamente os serviços que os ecossistemas fornecem, oferecer incentivos para atividades que apoiam a preservação das florestas e rios e punir aqueles que agem de maneira predatória e negligente.

Para preservar a Amazônia e sua biodiversidade, é necessário mudar como as empresas e países ganham dinheiro exportando produtos da região (como madeira, soja e carne). O importante é que governos, empresas e a população em geral se envolvam para criar uma economia mais verde e justa, que valorize a natureza e não destrua o planeta.

Para conservar a Amazônia a longo prazo, é muito importante apoiar financeiramente e legalmente as universidades e instituições de pesquisa que trabalham na região. Essas instituições são muito importantes para estudar e entender os diferentes tipos de plantas, fungos, animais e microrganismos da Amazônia, essenciais para manter o equilíbrio do ecossistema da região. Além disso, essas instituições são responsáveis por treinar novos cientistas que irão continuar a estudar e proteger a Amazônia no futuro.

No entanto, é preciso tomar medidas mais amplas para proteger a Amazônia. A comunidade global precisa trabalhar com os governos de todos os países contemplados com a floresta amazônica para limitar o aquecimento global a 1,5°C acima dos níveis pré-industriais. Isso inclui desestimular a exportação de produtos como soja, carne, madeira, minerais e hidrocarbonetos.

É importante lembrar que os Povos Indígenas e as Comunidades Locais têm um papel fundamental na preservação e restauração dos ecossistemas e da biodiversidade da Amazônia e de outras regiões tropicais, sendo fundamental reconhecer seus conhecimentos e direitos.

As melhores maneiras de proteger a natureza na Amazônia são aumentar as leis que protegem a área e punir aqueles que fazem atividades ilegais na região, seja ela gerenciada pelo governo, empresas privadas, comunidades ou povos indígenas.

Também é importante recompensar aqueles que trabalham de forma sustentável. Essas ações priorizam parcerias com povos indígenas e comunidades locais, áreas com espécies ameaçadas e ecossistemas importantes. As instituições financeiras internacionais devem parar de financiar projetos de infraestrutura na Amazônia até que sejam realizadas avaliações detalhadas do impacto ambiental.

Relatórios anuais de suprimentos de produtos importados ajudarão a responsabilizar as empresas. O sucesso dessas ações depende de parcerias de longo prazo entre empresários, cientistas e comunidades locais e indígenas. Eles fornecem recursos para proteger a terra, monitorar e restaurar ecossistemas e compartilhar informações sobre a biodiversidade.

É importante agir rapidamente para evitar o pior resultado possível para a Amazônia. Se falharmos em proteger a Amazônia, colocaremos em risco a nossa própria sobrevivência e a de toda a biosfera.

Referências

ALBERT, James S. et al. Human impacts outpace natural processes in the Amazon. Science, [S.L.], v. 379, n. 6630, p. 1-9, 27 jan. 2023. American Association for the Advancement of Science (AAAS).

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