Cientistas dos países amazônicos e parceiros globais compõem o Painel Científico para a Amazônia.
Este conteúdo foi produzido pela colunista Dra. Janaína Guidolini, idealizadora da Accessible Science.
Mais de 200 especialistas uniram esforços para debater, analisar e reunir o conhecimento da ciência, dos povos indígenas e de outras partes interessadas que vivem e trabalham na Amazônia. Essa união de esforços resultou em um relatório inédito intitulado ‘Painel Científico para a Amazônia (PCA).
O PCA apresenta o estado atual e as ameaças para a região amazônica, assim como as soluções possíveis para conservar e desenvolver a região de forma sustentável.
O sumário executivo do painel, publicado em setembro de 2021, traz as 20 principais mensagens dos especialistas em relação à Amazônia. Essas mensagens apresentam diferentes visões de desenvolvimento sustentável para a região.
Os especialistas concordam que o desenvolvimento deve ser ecologicamente saudável, socialmente justo, culturalmente inclusivo e economicamente próspero.
Em linhas gerais, o sumário fornece informações sobre o meio físico, biológico, biodiversidade e socioeconomia da Amazônia. Conheça as 20 mensagens centrais do relatório:
Mensagem 1: A biodiversidade da Amazônia é única e insubstituível. Esta região reflete processos complexos que ocorrem ao longo de milhões de anos.
Mensagem 2: A Amazônia contém parte considerável da biodiversidade global conhecida: 22% das espécies de plantas, 18% dos peixes que habitam os trópicos, 14% das aves, 9% dos mamíferos e 8% dos anfíbios. Estima-se que um grama de solo pode conter mais de 1000 espécies de fungos. Apesar disso, o conhecimento sobre muitas espécies é limitado, assim como a ecologia e distribuição geográfica delas.
Mensagem 3: A localização tropical e imensidão territorial da Bacia Amazônica são fatores cruciais para o clima do planeta. Nessa bacia, as florestas reduzem a temperatura da superfície da terra e geram chuvas. Essas chuvas ajudam no transporte do vapor d’água dos oceanos para os rios, fornecendo o maior volume de água em rio do mundo.
Mensagem 4: A Bacia Amazônica é responsável por 16% da produção terrestre de carbono. Além disso, entre 150 a 200 bilhões de toneladas de carbono estão armazenados no solo e vegetação. As florestas naturais absorvem grande quantidade de carbono. Já as áreas úmidas liberam de 6 a 8% das emissões globais de metano.
Mensagem 5: A Amazônia apresenta grande riqueza social e cultural. São cerca de 47 milhões de pessoas em toda a Amazônia, incluindo indígenas, quilombolas e outras populações tradicionais. As comunidades locais desempenham um papel crucial na geração, conservação e gerenciamento da diversidade agrícola e biológica amazônica.
Mensagem 6: A Amazônia é uma área de inovação agrícola e um dos poucos centros independentes de domesticação de plantas no mundo.
Mensagem 7: O desenvolvimento baseado em recursos naturais fez com que os países amazônicos passassem para os níveis mais elevados na exportação mundial de carne bovina, ferro, ouro, madeira, cacau e soja. Esse desenvolvimento aconteceu sob contexto de desigualdade social que, até hoje, influencia a dinâmica socioeconômica regional.
Mensagem 8: Grande parte da população da Amazônia é urbana (> 60%) e isso influencia o modo de vida das pessoas, que alternam entre atividades rurais e urbanas. As políticas de desenvolvimento (nacionais e regionais) tem favorecido o agronegócio e acentuado a migração urbana.
Mensagem 9: 17% da floresta amazônica foi convertida para outros usos da terra (pastagem e agricultura, por exemplo) e 17% foi degradada.
Mensagem 10: Uma rede de mais de 6.000 Terras Indígenas (TIs) e Áreas Protegidas (APs) em oito países e no território nacional cobre cerca de 50% da bacia amazônica. Estas áreas são pilares da conservação, da autodeterminação e dos direitos à terra dos povos indígenas e comunidades locais.
Mensagem 11: A Amazônia está cerca de 1,2 °C mais quente, um valor superior à média global de 1,1 °C, e com tendências de aquecimento médio anual em toda a região. Além disso, as secas e inundações extremas estão impactando o funcionamento da floresta.
Mensagem 12: O desmatamento, a exploração exagerada dos recursos naturais, a poluição e as mudanças climáticas são ameaças reais à biodiversidade amazônica. Plantas e animais correm sérios riscos de extinção. Além disso, as mudanças no funcionamento das florestas afetam a capacidade da Bacia Amazônica de fornecer bens e serviços essenciais para a humanidade.
Mensagem 13: O desmatamento e a degradação da Amazônia prejudicam a saúde e o bem-estar humanos, especialmente das pessoas mais vulneráveis como os povos indígenas e comunidades locais.
Mensagem 14: Três pilares apoiam a Amazônia em pé: 1) medidas de conservação, restauração e remediação; 2) desenvolvimento de políticas inovadoras e 3) fortalecimento da cidadania e da governança amazônica.
Mensagem 15: É necessário um novo olhar sobre a Amazônia para conservá-la e usá-la de forma sustentável. Isso requer maiores conhecimentos sobre as relações existentes entre o homem e a natureza.
Mensagem 16: É importante possibilitar o diálogo e interação entre diferentes culturas. Isso requer educação e capacitações que ampliem as trocas culturais.
Mensagem 17: A criação de estratégias para a conservação florestal e da biodiversidade são prioridade para manter os 83% restantes de floresta amazônica (preservada e não degradada) e diversidade cultural. Dentre os mecanismos possíveis para isso, destacam-se:
– aplicar a lei dentro e fora das áreas protegidas;
– integrar as áreas protegidas e sistemas agroecológicos em cadeias de abastecimento sustentáveis;
– incentivar a restauração das áreas degradadas;
– melhorar a gestão de instituições financeiras;
– envolver a sociedade civil e os movimentos sociais;
– criar novas formas de governança ambiental e de recursos;
– favorecer o trabalho colaborativo entre governos, organizações da sociedade civil e organizações indígenas para a conectividade andino-amazônica.
Mensagem 18: acabar com o desmatamento e a degradação florestal até 2030 é um desafio, mas é possível. Restaurar e reabilitar florestas degradadas e terras agrícolas desmatadas ou abandonadas pode promover benefícios econômicos e socioambientais.
Mensagem 19: uma bioeconomia inovadora quebra a contradição entre a conservação de longo prazo dos recursos naturais, capital cultural e os ganhos econômicos de curto prazo que esgotam esses capitais. Para habilitar o desenvolvimento de uma bioeconomia sustentável e dinâmica na Amazônia, é necessário:
– conter as atividades ilegais e crimes ambientais;
– fortalecer as cadeias de valor dos produtos da biodiversidade por meio da fusão de conhecimentos científicos e tradicionais;
– reduzir a assimetria de informação.
Mensagem 20: Alianças e compromissos entre países amazônicos e não amazônicos, como a Organização do Tratado de Cooperação Amazônica (OTCA) e o Pacto de Letícia, bem como nos níveis sub-regional e estadual, são particularmente importantes para:
– desenvolver e implementar políticas ambientais eficazes para prevenir, mitigar e compensar os impactos de projetos de infraestrutura e extrativistas;
– aumentar a colaboração em ciência, tecnologia e inovação para promover uma bioeconomia baseada em florestas e rios saudáveis.
Em suma, integrar visões distintas sobre o futuro da Amazônia é essencial para desenvolver princípios e valores comuns baseados no respeito aos limites da natureza. O PCA fez isso: envolveu centenas de vozes na organização e geração de conhecimento sobre a Amazônia.
Referência
Painel de Ciências para a Amazônia (2021). Resumo Executivo do Relatório de Avaliação da Amazônia 2021. C. Nobre, A. Encalada, E. Anderson, FH Roca Alcazar, M. Bustamante, C. Mena, M. Peña-Claros, G. Poveda, JP Rodriguez, S. Saleska, S. Trumbore, AL Val, L. Villa Nova, R. Abramovay, A. Alencar, ACR Alzza, D. Armenteras, P. Artaxo, S. Athayde, HT Barretto Filho, J. Barlow, E. Berenguer, F. Bortolotto, FA Costa, MH Costa, N. Cuvi, PM Fearnside, J. Ferreira, BM Flores, S. Frieri, LV Gatti, JM Guayasamin, S. Hecht, M. Hirota, C. Hoorn, C. Josse, DM Lapola, C. Larrea, DM Larrea-Alcazar, Z. Lehm Ardaya, Y. Malhi, JA Marengo, MR Moraes, P. Moutinho, MR Murmis, EG Neves, B. Paez, L Painter, A. Ramos, MC Rosero-Peña, M. Schmink, P. Sist, H. ter Steege, P. Val, H. van der Voort, M. Varese, G. Zapata et al. (eds.) Rede de Soluções de Desenvolvimento Sustentável das Nações Unidas, Nova York, EUA. 51 páginas.